Nobody Loves You More, álbum solo de estreia de Kim Deal.

Kim Deal estreia solo com um álbum gigante

Tempo de leitura: 7 min

“Nobody Loves You More” é um disco eclético, rápido, certeiro e mostra a genialidade da compositora Kim Deal.

Kim Deal lançou, no final de 2024, o álbum “Nobody Loves You More”, seu primeiro disco literalmente solo — pelo menos sob a alcunha de seu nome. Neste trabalho, ela mostra como enxerga a música e como precisa de liberdade para colocar para fora, sem amarras, toda a sua intimidade aliada à sua maneira de enxergar sua arte.

Julgamos pensar que seu nome dispensa apresentações, mas é sempre bom lembrar que Kim Deal fez parte de uma das bandas mais importantes do rock mundial, o sui generis Pixies, e que, na sequência, criou outra banda não menos relevante, os Breeders, ao lado de sua irmã gêmea, Kelley Deal. Em ambas as bandas, Kim sempre foi o ponto de estranheza, particularidade e referência nas composições peculiares.

Tanto os Pixies quanto os Breeders são bandas referenciais para uma infinidade de artistas e fãs do chamado rock alternativo. Kurt Cobain bebeu da fórmula “pixiana” e, depois, babava pelos Breeders, chegando a convidá-los para abrir seus shows pela Europa.

Essas referências e explicações têm muito a ver com o primeiro disco solo de Kim. Ela sempre demonstrou claramente o quanto e como queria que sua música soasse, fruto de uma infinidade de influências que acumulou ao longo do tempo.

Clipe de Nobody Loves You More.

Amiga de Robert Pollard, do Guided By Voices, referência do lo-fi americano, Kim apresenta neste novo trabalho um misto de simplicidade e complexidade, digno das composições de Pollard, sem deixar de lado a objetividade: 11 músicas em 35 minutos bem delineados.

Tem surf music e bossa nova, como na época em que ela imputava esses elementos aos Pixies? Tem sim. Tem música barroca, country americano e folk? Tem também. Tem algo mais contemporâneo? Claro. Aliás, Kim é símbolo de contemporaneidade, até mesmo sem querer ser. Há até bases eletrônicas, sem soar piegas e na medida certa. Tudo isso está presente no disco.

“Nobody Loves You More” carrega uma melancolia orquestrada e um naipe de metais digno das misturas brasileiras dos anos 70. Não dá para dizer se Kim se inspirou nos Mutantes ou nos grandes musicais americanos, mas a faixa de abertura traz uma mistura de arranjos de Rogério Duprat com Beatles e Beach Boys.

“Coast” é outra referência clara à cabeça viajandona de Brian Wilson. Uma ode ao líder dos Beach Boys e seu modo de compor músicas e letras simples, mas com uma genialidade pop. “Claramente, toda a minha vida fui tola. Tentei bater forte, mas estraguei tudo. É humano querer uma saída. É humano querer vencer”, canta Kim em “Coast”.

“Crystal Breath” é Kim sendo contemporânea. Bases eletrônicas, psicodelia, rap, indie rock, experimentalismo — tudo embalado e misturado em uma das melhores faixas do álbum. É a batida nos guiando, como diz parte da letra.

Kim Deal w/ orchestral ensemble ‘Crystal Breath’ Barbican, London 01/03/25

“Are You Mine?” é outra referência ao surf music, com direito a solo de slide guitar e arranjos orquestrados. Vale destacar que o disco traz vários arranjos de cordas e metais, capitaneados por Paul Mertens, membro do coletivo Poi Dog Pondering, formado no Havaí, com músicos de Chicago e Texas, que misturam diversos gêneros musicais com influências acústicas e eletrônicas.

A faixa mais rock e “guideana” do álbum é “Disobedience”. Com todas as forças, é uma música que Robert Pollard comporia facilmente para o Guided By Voices. 

Outras faixas de rock permeiam o disco e são maravilhosamente belas e diretas, como “Come Running” e “A Good Time Pushed” — esta, uma das últimas músicas gravadas por Steve Albini antes de seu falecimento, o que abalou a todos, incluindo Kim, sua amiga próxima desde os tempos de Pixies e Breeders.

O álbum é bem distribuído e recheado de ótimas composições. “Wish I Was”, “Bats in the Afternoon Sky” e “Summerland” carregam o padrão Kim Deal de estranheza e maestria.

Deixei “Big Ben Beat” por último porque ela condensa todo o álbum. Quer saber como é o disco? Como Kim é eclética? Como ela pensa a música? Está tudo ali em “Big Ben Beat”, com guitarras melódicas e barulhentas, baixo distorcido por Ayse Hassan (dos Savages), bateria marcante e o vocal único da cantora, regado a anos de álcool e cigarro, mas que não a fez perder seu jeito indefectível de cantar.

Kim teve todas as ideias e chamou um time de mais de 20 músicos para embarcar nesse belo trabalho. Além dos já citados, participam sua irmã Kelly e membros dos Breeders em algumas faixas, assim como Jack Lawrence (The Raconteurs), Josh Klinghoffer (ex-Red Hot Chili Peppers), Britt Walford (Slint), Fay Milton (Savages) e Raymond McGinley (Teenage Fanclub), entre outros.

Com várias faixas gravadas em diferentes estúdios, mas com base no Electrical Audio de Albini — que gravou quase todas as músicas —, fica evidente sua marca nos timbres dos instrumentos, principalmente baixo e bateria. Kim produziu e gerenciou todo o processo.

Um disco confessional, pensado e arquitetado ao longo de uma década, desde sua saída dos Pixies, passando pela doença e morte de sua mãe e pela pandemia, resultando em uma bela obra de arte em formato musical. Kim é rica em referências e precisa ser livre para fazer o que quer, na hora que quiser.

Avaliação: 4.5 de 5.

Ficha Técnica:

Álbum – Nobody Loves You More

Released – November 22, 2024

Label – 4AD

Musicians

Kim Deal – lead vocals, bass guitar, drums, guitar, keyboards, ukulele

Paul Mertens – horn arrangement, horn orchestration (tracks 1, 9); wind arrangement, flute, clarinet (4); string co-arrangement, French horn (9); saxophone (1)

Susan Voelz – string arrangement (tracks 1, 4), violin (1, 4, 9), string co-arrangement (9)

Jack Lawrence – bass guitar (tracks 1, 9)

Britt Walford – drums (tracks 1, 9)

Michael Mavridoglou – trumpet (track 1)

Kelley Deal – guitar (tracks 2, 5, 6), bass pedals (3), backing vocals (11)

Mando Lopez – bass guitar (tracks 2, 4, 6)

Lindsay Glover – drums (tracks 2, 4)

Chris Dixon – trombone (track 2)

Jim McBride – trumpet (track 2)

Dave Easley – pedal steel (track 4)

Jim Macpherson – drums (tracks 5, 11)

Josh Klinghoffer – additional guitar (track 6)

Mike Montgomery – backing vocals (track 6)

Fay Milton – drum programming, strings, synthesizers (track 7)

Ayse Hassan – bass guitar (track 7)

Alison Chesley – cello (track 9)

Patrick Holmes – guitar (track 11)

Raymond McGinley – guitar (track 11)

Technical

Kim Deal – production, recording

Marta Salogni – mixing

Heba Kadry – mastering

Ben Mumphrey – engineering, production assistance

Steve Albini – recording (tracks 1, 2, 4–6, 9–11)

Mike Montgomery – recording (tracks 1, 4, 6, 9)

Manny Nieto – recording (track 6)

Patrick Himes – recording (track 11)

Kyle Rector – production assistance

Jon San Paolo – engineering assistance (tracks 2, 4–6, 9–11)

Taylor Hales – engineering assistance (track 5)

Chris Witt – engineering assistance (track 5)

Visuals

Alex Da Corte – creative direction

Jake Wheeler – fabrication

Chloe Kucirka – costume

Matt Alie – set

Lanie Belmont – set

Matt Bogacki – set

Cy Gavin – set

Alec McGovern – set

Alicia Rinier – set

Rachel Brennecke – still photography

Clint Hild – retouching

Elliott Sellers – visual effects supervision

Erik Ferguson – CGI art

Harvey Benschoter – additional CGI art

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